domingo, 12 de julho de 2009

PROPOSTAS DO PAPA PARA “CIVILIZAR” A ECONOMIA !



A encíclica Caritas in Veritate, “sobre o desenvolvimento humano integral na caridade e na verdade”, publicada por Bento XVI, apresenta propostas para “civilizar” a economia, em plena crise financeira.

A carta, dirigida pelo Papa “a todos os homens de boa vontade”, nas suas 136 páginas actualiza a doutrina social da Igreja, em particular os ensinamentos das encíclicas Populorum Progressio, publicada por Paulo VI em 1967, e Sollicitudo rei socialis, de João Paulo II, publicada em 1988.

Algumas das frases mais destacadas desta terceira encíclica do pontificado do Papa Joseph Ratzinger.
* * *
--Caridade sem verdade:"Sem verdade, a caridade cai no sentimentalismo. O amor torna-se um invólucro vazio, que se pode encher arbitrariamente. É o risco fatal do amor numa cultura sem verdade." (n. 3)

--Caridade sem Deus:"Um cristianismo de caridade sem verdade pode ser facilmente confundido com uma reserva de bons sentimentos, úteis para a convivência social mas marginais. Deste modo, deixaria de haver verdadeira e propriamente lugar para Deus no mundo." (n. 4)

--A Igreja não faz política:"A Igreja não tem soluções técnicas para oferecer e não pretende ‘de modo algum imiscuir-se na política dos Estados’; mas tem uma missão ao serviço da verdade para cumprir, em todo o tempo e contingência, a favor de uma sociedade à medida do homem, da sua dignidade, da sua vocação." (...) "Para a Igreja, esta missão ao serviço da verdade é irrenunciável". (n. 9)

--O progresso, uma vocação:"O progresso é, na sua origem e na sua essência, uma vocação: ‘Nos desígnios de Deus, cada homem é chamado a desenvolver-se, porque toda a vida é vocação’. É precisamente este fato que legitima a intervenção da Igreja nas problemáticas do desenvolvimento." (n. 16)

--A lição da crise:"A crise obriga-nos a projectar de novo o nosso caminho, a impor-nos regras novas e encontrar novas formas de empenhamento, a apostar em experiências positivas e rejeitar as negativas. Assim, a crise torna-se ocasião de discernimento e elaboração de nova planificação." (n. 21)

--Propriedade intelectual:"Existem formas excessivas de protecção do conhecimento por parte dos países ricos, através duma utilização demasiado rígida do direito de propriedade intelectual, especialmente no campo sanitário." (n. 22)

--Progresso integral: Não é suficiente progredir do ponto de vista económico e tecnológico; é preciso que o desenvolvimento seja, antes de mais nada, verdadeiro e integral. A saída do atraso económico — um dado em si mesmo positivo — não resolve a complexa problemática da promoção do homem." (n. 23)

--Precariedade no trabalho:"Quando se torna endémica a incerteza sobre as condições de trabalho, resultante dos processos de mobilidade e desregulamentação, geram-se formas de instabilidade psicológica, com dificuldade a construir percursos coerentes na própria vida, incluindo o percurso rumo ao matrimónio. Consequência disto é o aparecimento de situações de degradação humana, além de desperdício de força social." (n. 25)

--O homem, primeiro capital:"Queria recordar a todos, sobretudo aos governantes que estão empenhados a dar um perfil renovado aos sistemas económicos e sociais do mundo, que o primeiro capital a preservar e valorizar é o homem, a pessoa, na sua integridade." (n. 25)

--Luta contra a fome:"Eliminar a fome no mundo tornou-se, na era da globalização, também um objectivo a alcançar para preservar a paz e a subsistência da terra. A fome não depende tanto de uma escassez material, como sobretudo da escassez de recursos sociais, o mais importante dos quais é de natureza institucional." (n. 27)

--Vida e desenvolvimento: A abertura à vida está no centro do verdadeiro desenvolvimento. Quando uma sociedade começa a negar e a suprimir a vida, acaba por deixar de encontrar as motivações e energias necessárias para trabalhar ao serviço do verdadeiro bem do homem." (n. 28)

--Desigualdades:"A dignidade da pessoa e as exigências da justiça requerem, sobretudo hoje, que as opções económicas não façam aumentar, de forma excessiva e moralmente inaceitável, as diferenças de riqueza e que se continue a perseguir como prioritário o objectivo do acesso ao trabalho para todos." (n. 32)

--O mercado:"Sem formas internas de solidariedade e de confiança recíproca, o mercado não pode cumprir plenamente a própria função económica. E, hoje, foi precisamente esta confiança que veio a faltar; e a perda da confiança é uma perda grave." (n. 35)
"A sociedade não tem que se proteger do mercado, como se o desenvolvimento deste implicasse esse facto a morte das relações autenticamente humanas. É verdade que o mercado pode ser orientado de modo negativo, não porque isso esteja na sua natureza, mas porque uma certa ideologia pode dirigi-lo em tal sentido." (n. 36)

--Os pobres, uma riqueza:"Os pobres não devem ser considerados um ‘fardo’, mas um recurso, mesmo do ponto de vista estritamente económico." (n. 35)

--Democracia económica:"Na época da globalização, a actividade económica não pode prescindir da gratuidade, que difunde e alimenta a solidariedade e a responsabilidade pela justiça e o bem comum em seus diversos sujeitos e atores. Trata-se, em última análise, de uma forma concreta e profunda de democracia económica." (n. 38)

--A empresa:"Um dos riscos maiores é, sem dúvida, que a empresa preste contas quase exclusivamente a quem nela investe, acabando assim por reduzir a sua valência social." (n. 40)

--Especulação:"É preciso evitar que o motivo para o emprego dos recursos financeiros seja especulativo, cedendo à tentação de procurar apenas o lucro a breve prazo sem cuidar igualmente da sustentabilidade da empresa a longo prazo, do seu serviço concreto à economia real e duma adequada e oportuna promoção de iniciativas económicas também nos países necessitados de desenvolvimento." (n. 40)

--Papel do Estado:"A economia integrada de nossos dias não elimina a função dos Estados, antes obriga os governos a uma colaboração recíproca mais intensa. Razões de sabedoria e prudência sugerem que não se proclame depressa demais o fim do Estado." (n. 41)

--Globalização:"A verdade da globalização enquanto processo e o seu critério ético fundamental provêm da unidade da família humana e do seu desenvolvimento no bem. Por isso é preciso empenhar-se sem cessar por favorecer uma orientação cultural personalista e comunitária, aberta à transcendência, do processo de integração mundial." (...) "A globalização a priori não é boa nem má. Será aquilo que as pessoas fizerem dela." (n. 42)

--Crescimento demográfico:"Considerar o aumento da população como a primeira causa do subdesenvolvimento é errado, inclusive do ponto de vista económico." (n. 44)

--Família:"Torna-se uma necessidade social, e mesmo económica, continuar a propor às novas gerações a beleza da família e do matrimónio, a correspondência de tais instituições às exigências mais profundas do coração e da dignidade da pessoa." (n. 44)

--Ética e economia:"A economia tem necessidade da ética para o seu coreto funcionamento; não de uma ética qualquer, mas de uma ética amiga da pessoa." (n. 45)

--Cooperação internacional:"A cooperação internacional precisa de pessoas que partilhem o processo de desenvolvimento económico e humano, através da solidariedade feita de presença, acompanhamento, formação e respeito. Sob este ponto de vista, os próprios organismos internacionais deveriam interrogar-se sob a real eficácia dos seus aparatos burocráticos e administrativos, frequentemente muito dispendiosos." (n. 47)

--Meio Ambiente:"A natureza está à nossa disposição, não como ‘um monte de lixo espalhado ao acaso’, mas como um dom do Criador que traçou os seus ordenamentos intrínsecos dos quais o homem há de tirar as devidas orientações para a ‘guardar e cultivar’." (n. 48)

--Problemas energéticos:"O açambarcamento dos recursos energéticos não renováveis por parte de alguns Estados, grupos de poder e empresas constitui um grave impedimento para o desenvolvimento dos países pobres." (n. 49)

--Energias alternativas:"Actualmente, é possível melhorar a eficiência energética e fazer avançar a pesquisa de energias alternativas; mas é necessária também uma redistribuição mundial dos recursos energéticos, de modo que os próprios países desprovidos possam ter acesso aos mesmos. O seu destino não pode ser deixado nas mãos do primeiro a chegar nem estar sujeito à lógica do mais forte." (n. 49)

--Solidariedade e educação: "Uma solidariedade mais ampla a nível internacional exprime-se, antes de mais nada, continuando a promover, mesmo em condições de crise económica, maior acesso à educação, já que esta é condição essencial para a eficácia da própria cooperação internacional." (n. 61)

--O relativismo empobrece:"Para educar, é preciso saber quem é a pessoa humana, conhecer a sua natureza. A progressiva difusão de uma visão relativista desta coloca sérios problemas à educação, sobretudo à educação moral, prejudicando a sua extensão a nível universal. Cedendo a tal relativismo, ficam todos mais pobres." (n. 61)

--Imigrantes:"É certo que os trabalhadores estrangeiros, não obstante as dificuldades relacionadas com a sua integração, prestam com o seu trabalho uma contribuição significativa para o desenvolvimento económico do país de acolhimento. (...) Todo o imigrante é uma pessoa humana e, enquanto tal, possui direitos fundamentais inalienáveis que hão-de ser respeitados por todos em qualquer situação." (n. 62)

--Finanças:"O inteiro sistema financeiro deve ser orientado para dar apoio a um verdadeiro desenvolvimento. Sobretudo, é necessário que não se contraponha o intuito de fazer o bem ao da efectiva capacidade de produzir bens. Os operadores das finanças devem redescobrir o fundamento ético próprio da sua actividade, para não abusarem de instrumentos sofisticados que possam atraiçoar os aforradores." (n. 65)

--Microcrédito:"Também a experiência do micro-financiamento, que mergulha as próprias raízes na reflexão e nas obras dos humanistas civis (penso nomeadamente no nascimento dos montepios), há de ser revigorada e sistematizada, sobretudo nestes tempos em que os problemas financeiros podem tornar-se dramáticos para muitos sectores mais vulneráveis da população, que devem ser tutelados dos riscos de usura ou do desespero." (n. 65)

--Consumidores e associações:"Um papel mais incisivo dos consumidores, desde que não sejam eles próprios manipulados por associações não verdadeiramente representativas, é desejável como factor de democracia económica." (n. 66)

--ONU:"Sente-se imenso a urgência de uma reforma quer da Organização das Nações Unidas quer da arquitectura económica e financeira internacional, para que seja possível uma real concretização do conceito de família de nações." (n. 67)

--Autoridade política mundial:"Para o governo da economia mundial, para sanar as economias atingidas pela crise de modo a prevenir o agravamento da mesma e em consequência maiores desequilíbrios, para realizar um oportuno e integral desarmamento, a segurança alimentar e a paz , para garantir a salvaguarda do ambiente e para regulamentar os fluxos migratórios urge a presença de uma verdadeira Autoridade política mundial." (n. 67)

--Os perigos da tecnologia:"A técnica apresenta-se com uma fisionomia ambígua. Nascida da criatividade humana como instrumento da liberdade da pessoa, pode ser entendida como elemento de liberdade absoluta; aquela liberdade que quer prescindir dos limites que as coisas trazem consigo. O processo de globalização poderia substituir as ideologias com a técnica." (n. 70)

--Meios de comunicação:"Dada a importância fundamental que têm na determinação de alterações no modo de ler e conhecer a realidade e a própria pessoa humana, torna-se necessária uma atenta reflexão sobre e a sua influência principalmente na dimensão ético-cultural da globalização e do desenvolvimento solidário dos povos." (n. 73)

--Bioética:"Hoje, um campo primário e crucial da luta cultural entre o absolutismo da técnica e a responsabilidade moral do homem é o da bioética, onde se joga radicalmente a própria possibilidade de um desenvolvimento humano integral. Trata-se de um âmbito delicadíssimo e decisivo, onde irrompe, com dramática intensidade, a questão fundamental de saber se o homem se produziu por si mesmo ou depende de Deus." (n. 74)

--Novas formas de escravidão:"As novas formas de escravidão da droga e o desespero em que caiem tantas pessoas têm uma explicação não só sociológica e psicológica, mas essencialmente espiritual. O vazio em que a alma se sente abandonada, embora no meio de tantas terapias para o corpo e para o psíquico, gera sofrimento. Não há desenvolvimento pleno nem bem comum universal sem o bem espiritual e moral das pessoas, consideradas na sua totalidade de alma e corpo." (n. 76).

--O desafio cristão:"O desenvolvimento tem necessidade de cristãos com os braços levantados para Deus em atitude de oração, cristãos movidos pela consciência de que o amor cheio de verdade – caritas in veritate –, do qual procede o desenvolvimento autêntico, não o produzimos nós, mas é-nos dado." (n. 79).

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